Tive o privilégio de assistir o Cirque du Soleil, em Porto Alegre. Uma megaestrutura extremamente organizada, bela, que dava a sensação de se estar em um outro universo. E eu estava. Cerca de uma hora antes da minha chegada, os ainda mais privilegiados que eu, do tapis rouge (ala VIP do Cirque), já estavam lá para fazer uma “boquinha” – se é que pode-se chamar salmão, champagne, e tudo mais de bom e à vontade, de “boquinha”. Não era o meu caso: estava na última fileira, a “R”. Mas não há lugar ruim na platéia, a não ser atrás de umas das colunas de sustentação da lona. Visibilidade ótima.
Como em todos os 15 espetáculos do grupo que rodam o mundo simultaneamente, o que veio ao Brasil, Alegria, possui som e luz impecáveis, artistas com talentos inquestionáveis, que fazem deles super-seres praticamente inatingíveis. A música ao vivo, sincronizada com os movimentos de cada número, é uma atração à parte que comprova que músicos, muitas vezes, não passam de malabaristas de seu instrumento; sem nenhuma conotação pejorativa. Trocando em miúdos, um espetáculo para ficar guardado para sempre.
Mas quem cairia na armadilha de comparar essa gigante do entretenimento mundial com a trupe pelotense de João Bachilli? Eu, é claro, que adoro um desafio de argumentação.
Acostumado a ver as peripécias do “circo do sol” na televisão, o que eu esperava eram números inusitados, quebrando paradigmas circenses, guiando o respeitável público por uma experiência totalmente nova. Não foi o que aconteceu. Levando em consideração a ausência de animais, os números de Alegria são os mesmos dos circos tradicionais que visitam nossas cidades há décadas. Estavam todos lá: contorcionistas, malabaristas, acrobatas, trapezistas, cuspidor de fogo, palhaços, dançarinas com bambolês, fitas… A destreza apresentada era fora de série, mas a mesmice circense não foi superada neste quesito. Alegria, que partiu para a Argentina, deve ser o roteiro mais terceiro-mundista entre os 15 em atividade do grupo canadense.
Sim… Mas onde entra o Tholl nessa história? Entra na primeira fila, como expectadores vorazes, aplaudindo e assimilando tudo que podem. Os seguidores pelotenses não contam com uma seleção mundial de artistas. Imaginem uma disputa de futebol entre os melhores do mundo e os melhores de Pelotas. A comparação seria até maldosa, se estivéssemos falando de futebol. Mas a equipe do Tholl não perde de goleada para a do Cirque du Soleil e seus artistas de mais de 55 países. Tholl não dispõe de uma estrutura itinerante que o permitiria criar números com maior apelo áudio-visual e apresentá-los sem as limitações e diferenças de cada palco em que sobem. Mas Tholl tem criatividade, profissionalismo, talento artístico e muita, mas muita disposição para levar seu público ao lugar que quiserem. Me emocionei muito mais com o Tholl do que com Alegria; talvez influenciado por outros fatores, como bairrismo, superação, coragem, obstinação, sei lá; ou talvez porque haja muito mais por de traz de um nariz de palhaço que as palavras possam explicar; coisas que um tapis rouge não pode pagar.