(este texto deve ser lido com bom-humor, alguma ironia, desprendimento e felicidade no coração)
O Rio Grande do Sul começou a degringolar quando o rock-gaúcho ensaiou alçar voos nacionais.
Os gaúchos costumavam ser um povo referente para o resto do País. Nossos índices sociais e econômicos, por muito tempo, estiveram no topo das estatísticas. Mas essa imagem veio se perdendo. Não só a imagem, como os fatos. Já falei sobre meu ódio por esse “orgulho gaúcho” imbecil aqui. Eu acredito piamente que, se não uma causa, uma dos primeiros sintomas da decadência foi o rock-gaúcho.
Note que usei “rock-gaúcho”, com hífen, pois não trata-se de preconceito geográfico. Não estou usando o “gaúcho” como adjetivo, mas falando daquele rock feito aqui nos anos 80, que começou a ser reconhecido como tal no resto do país. Ou seja, não estou falando de toda a produção de rock dessa década. Me refiro àquela “marrenta”, lotada de um sotaque forçado — de um magrinhês “que me fez te pegar nojo”. Para não começar a me repetir, já falei sobre isso. Leia aqui.
Vamos dar nome aos bois: me refiro a TNT, Cascavelletes, Rosa Tatuada e alguns outros contemporâneos, coniventes e cúmplices; me refiro ao rock “oh, yeeaaahh ééééé!”. Não falo do estilo musical em si e nem das composições, mas a esse jeito de cantar pretensamente rebelde-sem-causa. Outro dia, no Canal Viva — onde reprisam programas antigos da Globo — estava o TNT no Globo de Ouro, fazendo playback (olha a situação aqui) . Lembro que até Xuxa eles frequentaram poucas vezes. Acho até que chegaram a estar na trilha sonora de alguma novela do canal. Nesse momento, num ponto em que qualquer outro estilo musical teria se criado e procriado para todo Brasil, toda uma geração, duas, três, talvez quatro, de bandas e artistas gaúchos foram lançadas ao ralo. Quem, em sã consciência, no centro do país, ou em algum recanto por aí, haveria de comprar uma balaca tão insuportável quanto aquela? Ninguém estava preparado para aquilo. Era uma afronta, um desconforto, uma nojeira a quem via de fora. Muitas bandeiras espontâneas, sem representação na mídia, quando levantadas, são capazes de erguer súditos seguidores e se tornar uma força. Essa foi o oposto; antipropaganda.
“Sob Um Céu de Blues”, dos Cascavelletes, é uma baladinha sincera, meia-boca como tantas outras, não pior do que tantas populares por aí. Agora, escutem o jeito que o cara canta aqui (é o meu ponto). Uma tentativa de Mick Jagger extrapolada ao infinito.
Coitado do Nei Lisboa, e muitos outros, que foram jogados no mesmo balaio e nunca conseguiram se criar nacionalmente apesar de extremamente talentosos. Sei que vou sofrer apedrejamento por pensar e escrever este artigo. De gaúchos, claro. E o pior é que até eu chego a me acostumar e a ter certa nostalgia, afinal, era o que tocava quando eu era criança e adolescente. Lampejos de insanidade chegam a se apossar de minha mente em alguns momentos…
P.s.: Cachorro Grande tem um pouco disso tudo, mas eu acho BEM MAIS INTERESSANTE, porque já são uma releitura daquilo tudo e mais um pouco.