Em alguns lugares do País, chamam de amigo-oculto. Atualmente, a maior instituição do Natal, o amigo-secreto, é uma grande prova do consumismo, materialismo e impessoalidade. Contraditório, no mínimo. Tudo começou quando o hábito carinhoso de presentear os amigos e familiares de quem se gosta foi ficando cada vez mais caro e distante da realidade do brasileiro. Mesmo que um ou outro ainda tenha respaldo financeiro que o permita demonstrar, para o seus, todo o afeto que nutri através de uma lembrança de final de ano, o ato pode gerar constrangimento. Quem recebe pode não dispor da mesma condição. Foi, então, que alguém teve a brilhante ideia de criar um sistema em que cada participante é obrigado a comprar algo para alguém que não deseja presentear (que não gosta ou não tem intimidade para tal). Para dificultar e tornar o processo ainda menos sincero e destituído de qualquer sentimento, resolveram estipular valor para o regalo de cada um: “o presente tem que custar entre X e Y”. Convenhamos que, se já é difícil ter alguma ideia boa que agrade a quem não somos íntimos ou até mesmo àqueles com quem não vamos com a cara, imagine ter que enquadrar o achado em uma faixa de preço perversa e doentia.
Em uma empresa de nossa cidade, este ano, decidiram, novamente, fazer amigo-secreto, mas só que um pouco diferente. Para deixar o mercantilismo distante, resolveram que todos os presentes deveriam ser feitos de forma manual ao invés de, simplesmente, comprados. Assim, não houve limites mínimo nem máximo de preço. O que contava era a criatividade e a intenção. Algum mais bruto entrou em pânico — “não tenho habilidade manual alguma!” — certamente imaginando uma toalha de crochê ou um pano de prato bordado que teria que fazer. Mas a intenção era bem mais sutil que isso. Poderia ser uma música, um poema, até mesmo um pudim. De fato, na noite da entrega, todos foram surpreendidos pela imaginação de seu amigo-secreto. Um fez uma caixa com 3 CDs com canções compiladas; outro uma camiseta personalizada, feita com técnica mista (stencil, patchwork e termo-transferência); um mais inspirado, fez brigadeiros de maconha (estilo Weeds), vindos em uma grande caixa, dispostos em potes individuais com rótulos explicativos e um CD de músicas apropriadas para curtir a degustação. Questões morais e legais à parte, é inegável a mão de obra e imaginação do autor. Dizem que a erva fritando com a manteiga tomou conta dos corredores do edifício e os vizinhos quase chamaram a polícia.
Meu pai já sugeriu uma vez que o verdadeiro amigo-secreto não deveria ser feito através de sorteio e nem mesmo revelado quem comprou o presente. Cada um escolheria um companheiro para presentear. Todos os pacotes seriam colocados em uma pilha com o nome dos destinatários. Depois, os pacotes distribuídos. Sem dúvida, alguns não ganhariam nada e outros levariam mais de um, de acordo com a simpatia e amabilidade que cultivaram durante o ano. Nada mais justo, não é mesmo? O certo é que os contemplados iriam embora pra casa imaginando quem teria feito tal agrado. Quem gostaria tanto deles a ponto de escolhê-los entre tantos. Nunca se descobriria.
Acho que o mundo não está preparado para isso.
Porra, mas se os chefes do cara dos brigadeiros não demitiram ele depois desta festa, não demitem nunca mais! E achei a idéia do teu pai fantástica. A prática do fazer por merecer.
A-DO-RE-I! Estarei nessa com todas as minhas habilidades!!! Aguardem!