Desde os 15 anos tenho dores nas costas. São crises disparadas por um abaixar descuidado, uma mala mal carregada, essas coisas. Acontecia apenas uma vez por ano e não durava mais que dois dias. Só que há um mês, tive duas crises consecutivas, mais fortes e duradouras. Era preciso investigar. O médico ordenou uma ressonância e uma urotomografia (já que tenho pedras nos rins e, por muitos, a dor pode ser confundida).
“Urotomografia com contraste.” Esse nome estava me dando nos nervos. Imaginava por onde injetariam o contraste. Medo! Pesquisei superficialmente na Internet e não cheguei à conclusão tranquilizadora. Na hora marcada, veio o alívio: a injeção era com uma agulha monstro — mas no braço. Ufa!
Pra quem nunca fez, como eu, a tomografia é feita em uma máquina em forma de anel que passa pelo nosso corpo — ou melhor, pela qual nosso corpo passa — escaneando a região investigada. Ao contrário da ressonância magnética, que é um “túnel” claustrofóbico, com um ruído diabólico, que tentam aliviar com fones de ouvidos tocando uma música, com certeza, vinda do inferno.
Marquei os dois exames para o mesmo dia. Tomografia às 10h e ressonância às 17h30, em lugares diferentes. Em ambos, era necessário preencher uma ficha relatando alguns fatores de saúde, como alergias, doenças respiratórias etc. Na ressonância, pelo elevado magnetismo envolvido, questionaram até se eu já havia levado tiro — poderia haver algum fragmento metálico perdido dentro de mim. Na tomografia fazem você assinar um termo que fala das chances de problemas com o contraste injetado: 5% das pessoas têm algum tipo de reação alérgica indesejada; algumas delas precisam de tratamento para resolver; mas, o pior de tudo, uma em 70 mil morre! Avaliei que era como ser motoboy por um dia em São Paulo. A cidade tem 200 mil e três morrem por dia. É quase a mesma proporção. É uma chance boa.
Já à tarde, dentro da máquina, quando iniciou a ressonância, lembrei de um episódio de House. Um paciente foi submetido ao mesmo procedimento. Mas ele tinha algum objeto metálico na perna (acho), o que ocasionou um problema sério: o objeto foi arremessado para fora do corpo. Fechei os olhos para reduzir a sensação de ser enterrado vivo e comecei a vasculhar a memória em busca de algum fato esquecido de minha vida que pudesse me trazer um problema parecido. Adivinha. Não precisei ir longe. Lembrei da tomografia que fiz pela manhã e do contraste injetado. Sei lá que contraste era. Mas seja lá qual substância fosse, certamente, ainda estava correndo em minhas veias. Como tomografia também é um exame magnético, deduzi que o líquido injetado pudesse conter algum elemento metálico. Entrei em um pré-pânico! Não sabia se gritava para chamar alguém ou corria o risco. Meu corpo começou a esquentar. Meu olho coçava. Minhas pernas formigaram. Meu coração palpitava estranho. Senti o sangue correr nas veias do meu cérebro. A música do demônio tocava em meus ouvidos. O barulho do inferno estava ao fundo. O diabo batia à porta no ritmo do som da máquina: “tum, tum, tum, tum!”
Esperei a morte chegar.