O Imbecil x O Chato

Entre os diversos tipos de imbecis, fiquei, recentemente, encucado com um deles. Já não é a primeira vez que esse vem ao meu blog me chamar de chato. Fiquei em dúvida se eu deveria ou não dedicar o meu tempo a um tipinho desse gabarito, mas como resolver o impasse estava tomando muito tempo (mais de 15 segundos) e eu achava que precisava de um novo post, resolvi escrever. Afinal, esse tipo de assunto deve ser comentado pois trata-se de uma dessas doenças do mundo e merece atenção, assim como o aquecimento global e o desarmamento da população.

Eu fico imaginando o que faz o imbecil procurar com determinada freqüência minha página se me considera um chato.

Opção 1 – a mais simplista: o imbecil é também masoquista.

Opção 2: ela acha o mundo inteiro chato mas meu blog um pouco menos, então, apesar adjetivar-me dessa forma, encara este espaço como um lugar de certo alívio. É como estar queimando a 300ºC graus e buscar um descanso aos 200ºC. Vai entender…

Opção 3: além de imbecil é, infelizmente, um vagabundo sustentado do pelo pai que, como não tem nada que fazer, fica entrando em blogs alheios para xingar anonimamente as pessoas.

Opção 4: ele não é um vagabundo, mas usa o seu tempo livre para ficar lendo o que eu escrevo, ao invés de estar com sua família ou amigos. Ah! Acho que descobri: ele não tem família e nem amigos, é claro. Ninguém gosta de se envolver com um imbecil.

Por outro lado, fico muito feliz de ser um chato. Aliás, está escrito no cadastro do perfil deste blog algo que eu digo sempre: “os chatos salvarão o mundo”. Só não sabia que eu estava com essa bola toda. :)

Detritos Cósmicos

Estou com medo de ouvir Frank Zappa. Conheço sua voz, mas não sei cantarolar nenhuma de suas melodias. É uma falta. Grave. Gravíssima. Das piores. Dezenas de pontos na carteira – de músico (que não tenho).

Comecei a ler o livro, organizado por Fabio Massari, em sua homenagem. Não tenho nenhuma música. Fico imaginando. Cada colaborador da publicação tenta me convencer que Frank é um gênio. Eles descrevem suas obras. Quero baixar todos os seus trocentos discos. Mas não tenho coragem. Estou com medo de começar pelo álbum errado. Será que existe algum “álbum errado”? E se eu não entender o contexto? E se eu não estiver preparado? Cadê o manual? Pensei em fazer um acordo comigo mesmo: não escuto nada, acabo o incrível livro – páginas totalmente parciais – e finjo, com toda a minha força, que sou fã do Mestre desde pequeno. Alguns o classificam como um Deus. Se assim o for, meu raciocínio faz sentido: não é preciso ver (no caso, ouvir) para crer. Mas sempre fui ateu. Tá bom, talvez semi-ateu. Fico confuso.

A capa do livro me convida. Ele está olhando pra mim. É um chamado. Estou com medo de Frank Zappa. Alguém me ajuda?

Vasculhando minhas pastas no micro, achei a “CD Chain 2”. Temos um grupo de discussão de remanescentes do UNS ROCK e fizemos duas correntes de CDs, onde um personalizava um CD para outro. Tipo um amigo-secreto, só que de CDs. Na segunda edição, tirei a Gabi e fiz um CD com músicas que eram importantes para mim nos anos 80, principalmente (e são, ainda, por que não?). Tinha direita à capinha e comentário. Resolvi colar aqui, antes que eu perca :)

Cuscutlan – Frente! / Marvin The Álbum (1994)
Comprei o disco por causa (claro) do cover da Bizzare Love Triangle e, para minha surpresa, as demais músicas eram muito melhor do que isso. A banda australiana acabou. Depois Angie Hart (se não me engano o nome) fez um duo com um cara, que chamou-se Splendid. É legal, mas não tão original. A gente tocava isso na época que a Doidivanas era uma banda cover. Frente! Reforçou meu gosto por mulheres vocalistas com vozes angelicais.

Kid Abelha – Uniformes / Educação Sentimental (1985)
Da fase quando o Kid Abelha tinha o Leoni. Uma vez, fizemos uma banda com quem tinha na aula e tocamos essa música em 91 (eu acho), em uma apresentação dentro da disciplina de português. Tá, não vou explicar tudo que é muito longo.

Brasília – Plebe Rude / O Concreto Já Rachou (1985)
Na minha fase punk, Plebe Rude era o mais pop dos chamados “punks”. Hoje, a gente vê que de punk não tem nada (só o discurso, mas muito mais bem elaborado do que as demais bandas que eu escutava – Cólera, Grinders, Garotos Podres, Olho Seco, Vírus 27, Tropa Suicida …). Além dessa música ser boa, o que mais eu gosto é que tenho a impressão que eles fizeram a harmonia de base primeiro e cada um dos vocalistas levou para casa e vez sua melodia. Aí, cada um encaixou a sua e cantaram juntos. Acho demais.

Mobral – Casseta & Planeta / Preto com Um Buraco no Meio (1989)
Este disco é muito bom. Muito especial. Não era, como agora são os lançamentos deles, um caça-níqueis. Foi muito bem feito, tocado só por feras como Egberto Gismonte, Léo Gandelman, etc. O talento musical desse disco fica por conte de Mu Chebabi (membro escondido do grupo), que compôs as músicas e canta algumas, por exemplo, esta. A melhor fase do Casseta & Planeta. A gravação é ruim, pois é de vinil e feita sem equipamento bom.

Private Investigations – Dire Straits / Love Over Gold (1982)
Com a coletânea Money for Nothing eu comecei a sair do punk e perceber que música era muito mais do que eu achava que era. Na guitarra de Mark Knopfler, descobri o lado da emoção; descobri que uma melodia bem colocada, uma nota precisa, poderia levar a gente para um lado que eu nunca tinha ido. Foi nessa onda que eu comecei a ouvir o The Wall. Hoje, Dire Straits me parece um pouco simplório e o Mark Knopfler nunca mais fez nada que prestasse, apesar de eu comprar vários discos solo dele e ser capaz de comprar até hoje.

A Revolta dos Dândis 2 – Engenheiros do Hawaii / A Revolta dos Dândis (1987)
Claro. Óbvio. Quem não ouviu Engenheiros? Esse disco é o melhor até hoje. Nos seguintes eles começaram a se achar muito músicos e começaram a fazer pouca música. Este ainda é bastante sincero.

Acrilic on Canvas – Legião Urbana / Dois (1986)
Hoje eu tenho um baita preconceito contra a Legião. Mas depois de Blitz e RPM, este disco deles foi, junto com o primeiro dos Engenheiros, um dos meus primeiros discos de rock (fitas, diga-se de passagem). Essa foi uma das poucas músicas que não tocaram muito desse disco. Eu gosto dela.

A Vida Não Presta – Léo Jaime / Sessão da Tarde (1985)
Eu não era fã do Léo Jaime, mas não havia como não ouvir, pois tocava em todos os lugares. Tenho que confessar que hoje ele seria um dos meus ídolos. É uma espécie de Frank Jorge, só que mais talentoso. E mais pop também.

Underwater Love – Faith No More / The Real Thing (1989)
Eu conheci Faith No More antes do Rock in Rio que eles vieram; antes de ter clipe na MTV. Aliás, só assistia MTV quem tivesse antena parabólica. Eu não tinha. Essa foi uma daquelas fitas que um grava pro outro, que grava pro outro… Nem sei qual foi a fonte original. Acho que foi o Schaun ou o Abelha. Grande banda. Pena que acabou. Hoje fico pensando se Faith no More não equivaleria a asneiras atuais como Linkin Park e demais bandas de new metal totalmente montadas.

Jokerman – Caetano Veloso / Circulado Vivo (1992)
Não sou fã fervoroso do Caetano, mas gosto dele. Não tenho muitos discos e nem acompanho sua carreira, mas este, ao vivo, eu curti muito. Devemos admitir que o cara é muito talentoso. Uma vez, eu ouvi ele dizendo que não se considerava um músico; ele era um cineasta. Só que cinema ele não conseguiu fazer, mas música sim. Eu entendo em parte. Comparando ele com o Gil, ele é mais “artista” e o Gil mais “músico”. Ou seja, Caetano tem a visão global e poderia fazer qualquer tipo de arte, Gil tem o dom musical. Por isso que eu gosto mais do Caetano.

Tag Team Partners – Living Colour / Time´s Up (1990)
Escutar Living Colour hoje é difícil. Apesar de ter sido importantíssimo pra mim, fica meio vago demais e as coisas parecem meio sem sentido. É meio como o Faith No More, mas pior. Por isso, escolhi uma vinheta ao invés de uma música. Eu sempre gostei dela e já a usei para diversos fundos musicais em várias oportunidades.

Os Metaleiros Também Amam – Língua de Trapo / Festival dos Festivais (1985)
Quem diria que em 1985 já tinha gente fazendo metal-brega? Se prestar bem atenção, até meio milonga é. Eu tinha uma fita do Festival dos Festivais e, é claro, gostava, entre outras,  também da Condor de Oswaldo Montenegro (mas essa eu não faria o desfavor de colocar na seleção). Óbvio que perdi a fita, por isso eu ia colocar uma versão de um disco ao vivo do Língua de Trapo, mas não é tão legal (apesar de ser totalmente Massacration). Portanto, achei essa na Internet, em qualidade muito da duvidosa… Mas, pensando bem, deve ser da mesma qualidade que a minha fita tinha.

Músico – Os Paralamas do Sucesso / Severino (1997)
Com letra do Tom Zé e música de Bi Ribeiro e Herbert Vianna (quase nunca Bi compõe), esta nem é tão velha assim, mas escolhi por representar os Paralamas e um dos álbuns que mais gosto deles (por que será que os melhores álbuns são os que vendem menos?).

Nobody Home – Pink Floyd / The Wall (1979)
Eu fui ver o filme The Wall em uma reprise no Tabajara com um amigo meu que gostava (lá por 87, eu acho). Nunca tinha parado para escutar Pink Floyd e talvez nem estivesse preparado para isso. Me marcou muito e virou meu álbum de “cabeceira” por muito tempo.

O Drama de Angélica – Tangos & Tragédias (1988)
Antes mesmo de eu ir ver o espetáculo, o Martins tinha este vinil que eu gravei e ouvia direto. Depois vi mais de 4 vezes. Agora está cada vez mais ficando chato de assistir (também, pudera). Acho até que esta música eles tiraram do repertório para colocar coisas novas (não tenho certeza). Gosto das rimas proparoxítonas.

Here Today, Gone Tomorrow – Ramones / Rocket to Russia (1979)
Preciso falar alguma coisa de Ramones?

Pretty Little Ditty – Red Hot Chili Peppers / Mothers Milk (1989)
Na onda do funk metal, na qual era impossível não se envolver, os Chili Peppers eram os percussores. Este, depois do Blood Sugar, é o disco deles que mais gosto e esta, uma música um pouco atípica deles, que acho que abriu novas possibilidades para o referido álbum seguinte.

O Beijo da Aranha – Blitz / As Aventuras da Blitz (1982)
O primeiro disco de rock que eu tive foi o single da Você Não Soube Me Amar, que de um lado tinha o hit e do outro o Evandro Mesquita gritando “nada, nada, nada, nada”. Depois ganhei da mãe a fita do álbum inteiro. Eu tinha 8 anos. Em circunstâncias normais, talvez eu colocasse aqui a faixa “O Romance da Universitária Otária”, mas como eu já a coloquei no meu CD-convite de casamento, escolhi outra que a Gabi ainda não conhece (eu acho).

Fallin’ – Teenage Fanclub & De La Soul / Judgment Night (1993)
Trilha sonora original do filme. Toda feita com encontros de bandas. Como eu poderia deixar de ter um disco com Faith No More, Living Colour, Pearl Jam, entre outras, fazendo parcerias inéditas? Teenage eu nem ouvia na época, mas a música é legal e se justifica hoje.

Wrapped Around Your Finger – The Police / Every Breath You Take: The Singles (1986)
A música, na verdade, é do Synchronicity (83). Mas eu gostava mesmo era da coletânea, onde todas eram do caralho. Melhor do que Police, só mesmo os 3 discos da fase do Sting entre Soul Cages e Mercury Falling, incluindo o Ten Summoner´s Tales. O resto da carreira solo é deprimente.

Pavimentação – Titãs / Go Back (1988)
Não. Titãs não poderia ficar de fora. Esta música foi gravada originalmente no disco Televisão, onde os Titãs ainda estavam naquela de iê-iê-iê. Mas esta versão é matadora. Gravada na Suíça, no Festival de Montreaux. A gente tocava isso na Miss Troupe e, talvez na Doidivanas, não lembro. Era muito massa.

Garçon…

Por favor, uma água. Sem gás. Sem gelo. Sem limão. Sem açúcar. Sem ser diet. Sem sal. Sem pimenta. Sem alface. Sem cebola. Sem bacon. Sem ovo. Sem maionese. Sem borda recheada. Sem azeitona. Sem camisinha. Sem pintura metálica. Sem vaga na garagem. Sem abas. Sem cara de nojo. Sem reclamação. Sem má vontade. Sem glúten. Sem demora. Sem erros. Só uma porra duma água! Sem cuspe. Só água!

Agora

No primeiro trabalho solo de Arnaldo Antunes, ele conta a vida ao contrário. Da morte ao nascimento.

AGORA QUE AGORA É NUNCA
AGORA POSSO RECUAR
AGORA SINTO MINHA TUMBA
AGORA O PEITO A REBUMBAR

AGORA A ÚLTIMA RESPOSTA
AGORA QUARTOS DE HOSPITAIS
AGORA ABREM UMA PORTA
AGORA NÃO SE CHORA MAIS

AGORA A CHUVA EVAPORA
AGORA AINDA NÃO CHOVEU
AGORA TENHO MAIS MEMÓRIA
AGORA TENHO O QUE FOI MEU

AGORA PASSA A PAISAGEM
AGORA NÃO ME DESPEDI
AGORA COMPRO UMA PASSAGEM
AGORA AINDA ESTOU DAQUI

AGORA SINTO MUITA SEDE
AGORA JÁ É MADRUGADA
AGORA DIANTE DA PAREDE
AGORA FALTA UMA PALAVRA

AGORA O VENTO NO CABELO
AGORA TODA MINHA ROUPA
AGORA VOLTA PRO NOVELO
AGORA A LÍNGUA EM MINHA BOCA

AGORA MEU AVÔ JÁ VIVE
AGORA MEU FILHO NASCEU
AGORA O FILHO QUE NÃO TIVE
AGORA A CRIANÇA SOU EU

AGORA SINTO UM GOSTO DOCE
AGORA VEJO A COR AZUL
AGORA A MÃO DE QUEM ME TROUXE
AGORA É SÓ MEU CORPO NU

AGORA EU NASÇO LÁ DE FORA
AGORA MINHA MÃE É O AR
AGORA EU VIVO NA BARRIGA
AGORA EU BRIGO PRA VOLTAR

AGORA

A Dama da Água (Lady in The Water)

Ponto alto do filme

Lá vem o Cuca de novo falar do Shyamalan. Sim, finalmente, eu vi A Dama da Água. Depois do filme ser açoitado pela crítica e esnobado pelos espectadores, minha expectativa com relação a ele deveria estar baixa. Mas como eu estou acostumado a esse tipo de opiniões, desprovidas de crédito algum, com relação aos filmes de Shyamalan, fui esperando ser surpreendido por algo bom, no mínimo. Também estou me doutrinando a não levar preconceitos para a sala de cinema e nem para a minha própria, o que, sem dúvida, se eu obter sucesso na empreitada, me fará uma pessoa melhor.

Por que as pessoas não gostaram, a priori?

Trata-se de uma fábula, só que transcorrida em um ambiente contemporâneo, em meio a pessoas comuns. Quem é fã do Senhor dos Anéis, certamente deve ter torcido o nariz para a história. Não tem o cenário, o figurino, os efeitos visuais, os copy+paste e nem, muito menos, a pretensão da trilogia e seus clones. Se assim fosse, todos amariam. O público convencional, realmente não está acostumado a engolir produções que não vêm, de fábrica, mastigadas, salivadas e cheias de catchup. Os personagens do filme, não questionam as sobrenaturalidades que vão acontecendo. Todos acreditam piamente na história que o protagonista Cleveland (o excelente Paul Giamatti), está embarcando. E isso, talvez seja outro motivo para o desagrado do espectador. Afinal, ninguém tem orelha pontuda, nem é anão ou morto-vivo – são pessoas como eu e você – e, segundo a realidade e o convencionalismo adotado por Hollywood, pessoas normais não acreditam facilmente nas outras e no fantástico. Mas Night Shyamalan sabia disso e, para levar às telas o conto-de-fadas que criou para seus filhos, colocou um personagem para dar um tapa-com-luvas-de-pelica em seus mais fervorosos críticos. Mr. Farber (Bob Balaban) interpreta um desse tipo. A cena em que sucumbe, devido a sua própria incredulidade diante de uma história fora dos padrões, é o ponto alto do filme.

No mais, é um filme muito bom que mostra como as pessoas de hoje dão mais atenção aos acontecimentos externos do que aqueles que se passam dentro delas mesmas.

Clipes

Levar 5 anos para ficarem prontos não significa que resultou nos melhores clipes do mundo. A falta de quem editasse os dito-cujos no “amor” é que causou o atraso. Aproveitei minha jornada para dentro do mundo da edição não-linear, por conta do nosso DVD, para desencavar projetos antigos e abandonados. O resultado são os clipes da nossa música “Minha Vida” (Água de Melissa) e da “300 Noites” da Doidivanas, ambos registrados mais ou menos na mesma época. “Minha Vida” teve o apoio de Deny Barboza (da Capitão Araújo) na câmera e de Wagner D’Oliveira dando assintência na produção. No “300 Noites”, fui assistido na produção por Raquel Heidrich, Jaques Rangel, Rui Madruga e Cassiano Gasperin. Cada um dos clipes custou, mais ou menos, R$10,00 – o preço de um fita miniDV na época.

Os 2 estão no You Tube:

Você não comenta em um blog, quando:

1. você não tem nada a falar sobre o assunto – é claro;
2. você não quer que a pessoa saiba que você é visitante assíduo;
3. você estava indo comentar, mas a pessoa que o fez, antes de você, disse exatamente o que você diria;
4. você estava indo comentar, mas a pessoa que o fez, antes de você, escreveu algo tão constrangedor, que nunca seria escrito por alguém de bom-senso, que comentar a seguir dela denunciaria que você leu o que ela disse. É embaraçoso demais. Não dá nem pra fingir que não leu. Você prefere fingir que passou batido pelo post e seus comentários;
5. você sabe que tudo o que poderia ser dito só geraria conflito desnecessário e ainda te achariam um chato. Releve.

Ah, o cocô nosso de cada dia!

Entre manter um baldinho de merda no banheiro ou correr o risco de entupir o vaso sanitário, eu prefiro a segunda opção. Entre ter que recolher diariamente papéis cagados do baldinho de merda ou assumir o risco de entupir a privada, eu fico com a segunda opção. Entre milhares de papeizinhos cagados voando pelo ar em um aterro sanitário, da lixeira revirada por cachorros em frente a minha casa, do caminhão de lixo, até, ou arriscar de entupir a latrina, eu continuo, mesmo, com a segunda opção.

Há, pelo menos, 23 anos eu coloco papel higiênico no vaso. Estou na terceira casa, desde então, sendo que em uma delas eu morei por 16 anos. Somando todos os meus lares, se tive 5 entupimentos, foi muito. E nada que eu mesmo não resolvesse em 2 minutos. O papel se decompõe muito mais rápido na água do que na terra ou no ar. É muito mais ecológico do que mandar os seus “envelopinhos carimbados” para ficarem voando em um lixão, caindo em qualquer lugar e poluindo, não só visualmente, o meio. É claro que não aconselho a todo mundo que coloque papel em seu vaso se a bitola de seu (calma, não vou falar besteria)… … se a bitola do encanamento do seu banheiro foi subdimensionada. Mas aconselho, sim, que, ao construir, dêem atenção ao correto diâmetro das tubulações para que elas permitam esta prática muito mais higiênica e ambientalmente menos nociva. Aconselho também que condicionem seus intestinos a liberarem-se, diariamente, no horário antes de um banho, o que facilita muito e garante um bom acabamento na limpeza; que gastem a quantidade mínima de papel para fazer um serviço bem feito, prefirindo despender maior volume de celulose mandando cartas para os amigos distantes, desenhando com giz, nanquim, lápis, escrevendo diários, ou fazendo qualquer outra atividade com um pouco mais de glamour do que limpar a bunda com uma quantidade enorme de papel. E não me culpem! Eu não gastei nenhum centímetro de papel para escrever isto. Ah! E, antes que alguém levante a mão amarela para me acusar, eu não tenho a bunda nem os dedos sujos! :)

(Se alguém souber de algum aspecto técnico que eu desconheça, por favor, deixe-me saber.)

Linhas

Um passo curto, outro comprido, outro comprido, outro comprido, outro curto de novo. Não havia forma correta. Dependida da calçada; do piso do lugar. Não pisava nas linhas do chão. Caminhava irregular para não apoiar o pé, por um piscar de olhos que fosse, sobre uma emenda de calçada. Mania comum. Boba. Coisa de criança. Tinha que fazer e fazia desde sempre e pronto. Apenas não pisava. Não sabia exatamente o que aconteceria se quebrasse a regra que ele mesmo havia criado, mas muitas vezes imaginava. Uma só linha pisada e o chão ruiria sob seus pés. Cada erro poderia ser um dia a menos na vida de alguém que amasse. Morreria um urso panda – que já eram poucos, ele sabia, e os achava bastante simpáticos. Cada rejunte pisado apagaria uma das linhas das palmas de sua mão. Lembrava sempre dessa nos momentos que não conseguia pensar em nenhuma nova. Era da que mais gostava. Quando perdia o foco da regra e encostava em uma linha, por pensar em outra coisa, como olhar para os lados para atravessar a rua ou encher a boca d’água com a carrocinha de picolé, checava rapidamente as mãos para ver qual a linha havia desaparecido. Muitas vezes não sabia certo o lugar de onde alguma teria sumido, mas imaginava. Em outras, tinha certeza: “havia uma linha bem aqui, eu sei”.

Se algo desse errado na vida, se alguma coisa que esperasse muito não acontecesse, lembrava da calçada exata onde tinha cometido o erro e da linha em sua mão que havia apagado. Chegou a pensar em consultar com freqüência uma profissional de quiromancia, para saber melhor a que se referiam as linhas que haviam sumido. Mas não fez. Não acreditava nessas coisas. Preferiu tirar cópias de suas palmas na copiadora do escritório. Registrava uma imagem de cada uma por dia e pendurava na parede do quarto. Assim poderia aferir visualmente o resultado de suas falhas, de suas distrações, e a quantidade de acontecimentos que ainda estavam por vir. Quando acabou o espaço nas paredes do quarto, teve que iniciar na sala. Planejou que o próximo cômodo seria o banheiro. As palmas estendidas nas paredes davam impressão que pessoas estavam presas atrás dos tijolos, empurrando, tentando sair.

Aos poucos, tinha uma explicação para cada expectativa frustrada, cada plano desfeito, cada dia monótono. Os dias, os meses, os anos passavam e as palmas dependuradas foram ficando cada vez mais lisas como as plantas de seus pés. Parecia um papel de parede degradê; do escuro pro claro; de cima a baixo, da esquerda para a direita. Sua vida também ficava cada mês mais vazia. Nos finais de semana, quando não ia ao escritório e não tirava cópias das mãos, analisava suas palmas o tempo todo e comparava-as com as imagens da sexta-feira.

Já era fácil contar quantas linhas restavam. Queria guardar uma para encontrar o amor da sua vida, outra para fazer um filho, outra pedir demissão do seu emprego, outra para ter muito dinheiro – mas só o suficiente para não se preocupar mais com isso –, outra para fazer parar as guerras (ou será que para isso o correto não seria guardar, mas apagar uma linha?). Todavia restavam poucas e algumas realizações consumiriam, sem dúvida, muito mais do que uma delas. Achou melhor pensar em destinos menores, que consumissem menos linhas. Queria uma linha, então, para ter um aeromodelo, outra para tomar um café na sua esquina favorita, outra para que seus amigos estivessem lá, outra para um abraço apertado em alguém, outra para ir visitar sua mãe no Natal e outra para dar adeus.

Acordou, olhou pela janela e percebeu que a cidade estava vazia. As linhas em suas mãos já não eram suficientes para que as pessoas fossem às ruas. Saiu para ver. Os carros não andavam, as nuvens não passavam. Havia pássaros caídos, com as asas abertas, como que congelados entre uma batida de asas e outra. Alguns sinais estavam abertos, outros fechados, outros amarelos. Mas não mudavam mais de cor. As vitrines exibiam televisões fora do ar. Os luminosos não piscavam, os ponteiros dos relógios não se mexiam e as árvores não dançavam com o vento. Ele nem mesmo soprava. Voltou para casa, tomando cuidado excepcional – com uma atenção que jamais havia tido – para não pisar em nenhuma outra linha. Dessa vez era fácil. Não havia semáforos para cuidar, sorvetes para salivar. Chegou em casa e não pisou no marco da porta, atravessou a cozinha na ponta dos pés, por entre as lajotas pequenas. Levou meia hora para cruzar o corredor, porque era de parquê. Deitou de lado na cama e nem se cobriu com o cobertor listrado, por precaução. Colocou o rosto próximo aos joelhos e fechou as mãos com toda a força. Quantas linhas ainda restavam? Talvez só uma. Preferiu não olhar.