O Pior Sotaque do Mundo

A língua é um dos maiores patrimônios de um povo. Ela e suas diferentes nuanças e subdivisões. O jeito como nos expressamos, as palavras que criamos e que transformamos são parte do que somos. Esse processo ajuda cada sociedade e microssociedade a tornar-se única. Todo mundo está careca de saber. Porém, os diferentes acentos linguísticos são também causa de desavenças interculturais e preconceitos. Inclusive meus.

Não tenho dúvida alguma que o sotaque mais detestável do mundo é o do gaúcho. Mais precisamente do porto-alegrense. Mais precisamente ainda do “magrão” porto-alegrense. Lembrando que o termo “magrão” é mais uma das expressões típicas de nossa cultura e que ninguém reconhece nos demais cantos do país. Mas não é isso que me dá nos nervos.

O que me incomoda não é o acento natural do porto-alegrense (que espalha-se como peste no interior do estado), mas a forçação-de-barra para deixá-lo mais jovial; a cantada arrastada na tentativa de ser mais aprazível, mais delicado, carinhoso.  E não são só os “magrões” que se valem do recurso. Olhem alguém comum dando entrevista na TV. Sempre exagera no arrastado, nos “nés”, nos “nés” arrastados. Arrrrgggg! Esses vícios só fazem piorar a já má impressão. Fico com vergonha alheia, (ou seria só “vergonha”) porque também sou gaúcho, também tenho sotaque, mas não faço parte desse grupo. Aos olhos de fora, todos falamos igual. Mas não falamos! Eu sou diferente! Eu juro.

Notícias de Ontem

Folheando o Diário Popular de hoje, me deparo com uma imagem de “Ensaio Sobre A Cegueira”, de Fernando Meirelles, na seção que traz a programação de TV. Como gostei muito do filme, pergunto se minha tia, ao meu lado, já viu. Ela diz que não e pede para que diga quando irá passar. Procuro na lista, que vai só até às 24h, e encontro: ele é o primeiro da relação, às 2:00 da manhã de hoje. Ou seja, já foi exibido no Telecine, provavelmente, antes mesmo da impressão do jornal e, ainda mais, do recebimento pelos assinantes e bancas. O que as pessoa responsáveis pela pesquisa, diagramação e revisão têm na cabeça? Por que publicam informações totalmente desnecessárias, inúteis, confundindo os leitores, como a indicação de um filme que já passou, ainda por cima dando-lhe destaque com foto e legenda?

Chego a desconfiar que trata-se da programação do dia seguinte, mas não há nenhuma referência à data, apenas aos horários e canais. Por coincidência, tenho ao meu lado uma Zero Hora. Verifico como procedem nesses casos. Lá está a listagem de programas iniciando, dependendo do canal, pelas 6h ou 7h da manhã (lógico – horário em que as pessoas começam a receber o jornal) e indo até a madrugada do dia seguinte.

Alguém explica o que acontece com o Diário Popular de Pelotas?

Viagem econômica a Porto Alegre

Já ensinei neste blog como abrir uma caixinha de leite, escrever “súper”, “ano-novo” e “ano novo”, “tele-entrega”, se comportar em uma rótula, fazer um bife, evacuar em banheiro alheio… Hoje, vocês aprenderão como economizar grana da gasolina ao ir e voltar de Porto Alegre.
O combustível na capital é cerca de 15% mais barato do que em Pelotas. Com meu carro, um Corsa Sedan 1.4, consigo ir, dar umas bandas e voltar com exato um tanque de gasolina. Portanto, me certifico que ao sair tenha, precisos, 3/5 de tanque cheio. Isso é suficiente para a viagem de ida e para o itinerário rotineiro em Porto Alegre. Entro na reserva com o ponteiro quase grudado no fundo. Na hora de voltar, abasteço completo. Pronto! Minha jornada foi realizada apenas com combustível de lá. A economia é suficiente para pagar duas entradas de cinema.
ATENÇÃO: antes de seguir esta dica incrível e genial, certifique-se do consumo, capacidade do tanque e combustível que seu carro está usando. No mais, você precisa ser uma pessoa fria, calculista e entender que, quando o ponteiro chega na reserva ainda dá para rodar mais cerca de 50km.

Agradecimento ao Hospital São Francisco de Paula

Em virtude de nossa passagem por lá na semana passada, minha mulher escreveu este texto que mandamos a Elói Tramontin e a sua equipe. Faço dele minhas palavras e publico aqui como agradecimento público ao Hospital e aos amigos. Tenho certeza que Alice, já feliz e faceira, quando crescer e entender o que aconteceu, esquecerá o medo que adquiriu de enfermeiros (sempre mexendo no acesso do bracinho) e será muito grata também.

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Ninguém nunca quer ficar doente. Mas ninguém nunca, nunca, nunca quer ver um filho doente.

Semana passada passamos um grande susto com nossa filha caçula de um aninho. Febre alta e persistente nos levaram ao pronto-atendimento de nosso plano de saúde. Lá tivemos um tratamento compatível com um feriadão de carnaval. Foi penoso. Foi duro. Eu chorei, eu rezei. A febre não cedia, a infecção era grave. As pessoas não tomavam atitude. Numa hora dessas a gente lembra que, mais do que um plano de saúde, precisamos de amigos. Vários se mobilizaram, rezaram e agiram. Não poderia nominar todos, mas meu coração pertence a cada um deles.

A internação foi feita no Hospital São Francisco de Paula e, durante o período que estivemos lá, só temos elogios a fazer. Desde a recepção ágil e carinhosa, nos colocando rapidamente em um quarto para que ela ficasse confortável até o atendimento recebido no leito. Tudo com carinho, com respeito. Nos faziam sentir únicos. A visita da nutricionista nos ajudando a pensar em uma melhor comidinha para a Alice, as meninas da limpeza sempre alegres e simpáticas, o pessoal da enfermagem atencioso e com muita simpatia também.

Não fosse a tristeza do motivo da internação poderia dizer que passamos o feriadão de carnaval no Hotel São Francisco de Paula. Tivemos atendimento 5 estrelas e com muita humanidade.

Faço parte da equipe que criou o Chico, o personagem que representa o Hospital. Quem o desenhou foi minha sócia, Daniela. Posso dizer que quando ela pensou no Chico, cada traço que fez foi para personificar um mascote amigo, mimoso, carinhoso. Vocês dão vida ao Chico. Um  Chico que está em todas as partes mas, principalmente, no coração de cada um de vocês.

Obrigada. Vocês deram um show! Fico orgulhosa de ajudarmos de alguma forma o dia-a-dia deste Hospital!

Stela e Daniel, pais da Alice.

A saúde debilitada do Brasil – Alice no Hospital

O problema da saúde do país não é a falta de verba e não é (só) a roubalheira generalizada. O problema da saúde do país é a média da qualidade dos profissionais do meio. Existem 3 tipos de atendimento médico no Brasil: o público, pra quem é mero mortal; o de convênio, para quem é mortal; e o privado, para quem é quase imortal. Se incompetências e irresponsabilidades acontecem no nível médio, imagino o que não ocorre de muito mais grave, também no nível mais baixo e que ninguém fica sabendo.

Esta semana, passamos por um perrengue com nossa filha de um ano. Tenho necessidade e obrigação, como pai e cidadão, de contar aqui. É um depoimento quase ingênuo frente a tantos outros casos muito mais graves que acontecem todo dia, mas é a experiência que eu tive e que posso relatar. Fui escrevendo quase que simultaneamente aos acontecimentos, depois que me dei conta das barbeiragens sendo cometidas, muitas delas sob a “justificativa” do conceito de “pronto-atendimento”. Pulei várias, pois só conturbariam e aumentariam ainda mais a história.

Cronologicamente:

– sábado, 21h, percebemos Alice com febre. Mais de 38°C. Começamos a administrar Tylenol e Alivium, intercalados, de 3 em 3 horas, já que persistia. Damos alguns banhos para não perdermos o controle;

– domingo, depois do almoço, como não baixa de 38°C, levamos no pronto-atendimento da PlanoB (nome fictício trocado para proteger inocentes – no caso, eu). Sabemos que são necessárias 48h de febre para que o quadro infeccioso se manifeste em algum órgão e possa ser diagnosticado com maior precisão, mas a temperatura é alta demais. Ela é examinada pela plantonista da pediatria que nada encontra. Aconselha regressarmos no dia seguinte caso mantenha-se febril;

– segunda, pela manhã, a temperatura regride, mas ao meio-dia volta com força total (mais de 39°C). Voltamos à PlanoB. A plantonista não quer examinar Alice, alegando que é muito ruim clinicar em uma criança com febre. Devemos baixar a temperatura antes. Lá mesmo, após aguardar sem sucesso o efeito da dipirona na veia, damos banho, fazemos compressa, mas nada;

– segunda, 17h (aproximadamente), troca a plantonista. A nova aceita examiná-la, mas sem encontrar manifestações, nem mesmo de meningite. Chama uma colega que confirma o diagnóstico negativo. Ambas veem na garganta alguns sinais, mas concordam que a infecção não está ali. Pedem um exame de sangue e de urina a serem feitos de imediato no local. Assim é feito. Não pedem hemograma de cultura, para definir, em caso de infecção por bactéria, o tipo. Esse tipo de exame não é mais permitido no pronto-atendimento da ClínicaB. E continuamos no combate à febre: banho, compressa, antitérmicos;

– segunda, 18h30min (aproximadamente), os exames ficam prontos. O de urina não acha nada, mas no hemograma, a contagem de leucócitos (indicativo de infecção) está altíssima – mais de 21 mil. A médica solicita um raio-x do pulmão, já que pelo estetoscópio nada se percebe;

– segunda, 19h (aproximadamente), troca o plantão. Assume o Dr. Cínico (o nome foi trocado para proteger um inocente – ou dois: eu e minha esposa). O raio-x nada mostra. Ligamos para o pediatra oficial da Alice que está viajando (Carnaval), Dr. Flávio Chiuchetta (este nome não foi trocado pois ele é inocente e só vai receber elogios aqui). Pede que seja chamado um neurologista para averiguar, com propriedade, a possível meningite, já que não pode fazer a distância. É claro que a PlanoB não dispõe de neurologista de plantão, nem in loco, nem fora. Precisamos sair à cata de um. Passamos pelo mesmo problema no final de janeiro, quando meu pai teve um microaneurisma sem grandes consequências. A PlanoB não tem competência nem para fazer ligações telefônicas, quanto mais para encontrar um dos escassos neurologistas da cidade no feridão de Carnaval. Quando falo em não saber fazer uma ligação é pelo seguinte: o médico da Alice estava em um sítio fora de Pelotas, mas em um local com o código de área também 53. Avisamos que era necessário digitar o código. Elas não conseguiram. Tivemos que fazer do nosso próprio celular que mal pegava dentro do prédio. Quanto ao neurologista, conseguem contato com apenas um que diz poder ir. O mesmo que uma amiga nossa também consegue.

– segunda, 23h, nada do neuro. Dr. Chiuchetta (por DDD) e Dr. Cínico concordam que Alice deve ser internada (para nosso pavor) e iniciar imediatamente a administração de dois antibióticos (rifocin e garabicina), um específico para meningite e outro de amplo espectro (full range, digamos). A intenção é combater a potente bactéria de imediato, mesmo sem saber o nome dela, nem onde está alojada. É tipo como destruir Bagdá para matar o Saddan Russein. Mas era a atitude mais inteligente no momento (a do antibiótico, não a das bombas no Iraque);

– terça, 00h30min (aproximadamente), a PlanoB e o Dr. Cínico, finalmente conseguem autorizar nossa internação, uma hora e meia depois de decidido, com a agilidade de quem vai atender um caso de unha encravada. Pergunto ao Dr. Cínico se ele não irá examinar Alice, visto que estamos esperando que, a qualquer momento, haja manifestação do quadro infeccioso em algum órgão. Ele responde que não, pois ela já havia sido examinada. Questiono que isso faz mais de sete horas e que foi por outro médico, não por ele. Mas retruca não ser necessário. Fico puto, afinal, os sinais na garganta avistados pelas plantonistas anteriores, podem ter evoluído e serem, enfim, observados. A internação e administração dos medicamentos são feitas e assinadas por alguém que não examinou minha filha.

A partir daí somos extremamente bem atendidos no Hospital São Francisco de Paula graças a Elói Tramontim, diretor do complexo, e sua gentil equipe. Ficamos aguardando a visita do Dr. Cínico, já que o Dr. Chiuchetta só volta à cidade na quarta.

Continuando:

– terça de manhã, o neurologista vem. Faz todos os exames clínicos e nenhum deles aponta para meningite. Desaconselha punção na medula, por tratar-se de uma criança, doer muito, os riscos de contaminação pelo processo serem grandes e de não existirem sinais clínicos para o quadro diante de uma contagem tão expressiva de leucócitos. Pede exames de sangue diários para acompanhar a evolução da infecção. Gosto disso;

– terça à tarde, depois de uma solicitação minha via telefone e das exaustivas (para não dizer subumanas) mais de 20 horas de plantão que fez na PlanoB, Dr. Cínico aparece para ver Alice. Esquece o hemograma feito dia anterior no carro. Usa apenas o estetoscópio no exame, conversa um pouco e vai embora, dizendo que é isso aí mesmo. Trocando em miúdos, não a examina de novo. Está claro o que eu digo? O médico que internou minha filha, prescrevendo dois potentes antibióticos na veia, expondo-a a riscos de contaminação hospitalar por um prognóstico de, no mínimo, sete dias, além de todo o abalo moral e físico nosso e da nenê, NUNCA a examinou;

– quarta, ao meio-dia, como prometido, Dr. Chiuchetta retorna de viagem assumindo o caso. Faz um exame clínico completo e, ao olhar a garganta, diagnostica: “acredito que é um quadro viral”. Quase caímos no chão. 38 horas e o Dr. Cínico não pôde olhar a garganta e verificar a virose. Dr. Flávio solicita novo exame de que ficará pronto só no dia seguinte. Precisamos manter a medicação e a hospitalização até, pelo menos, a comprovação da hipótese. Dr. Cínico não aparece mais, para o bem dele;

– quarta, à tarde, Dr. Neurologista volta, examina novamente e traz uma novidade: o exame que solicitou no dia anterior mostra a contagem de leucócitos em 4 mil e pouco, ou seja, sem infecção.

– quinta, 13h, Dr. Chiuchetta a visita novamente. Exame completo mais uma vez. De posse do primeiro, segundo, terceiro e de um primeiríssimo exame, anterior a tudo isso, feito na sexta por simples rotina, conclui que ela teve um quadro bacteriano seguido de outro viral.. Precisará ficar, pelo menos, até sábado internada, quando teremos nova avaliação. Nessa hipótese, completará os 10 dias de antibiótico intravenoso em casa.

– sábado, 4h, Dr. Chiuchetta aparece de surpresa. É madrugada. Brincando, diz que perdeu o sono e resolveu visitar. Era brincadeira. Ele estava lá por ocasião de um parto. Mas resolveu passar para dar uma olhada. Esse tipo de coisa demonstra o comprometimento e carinho que deve ser inerente à profissão de médico;

– sábado, 14h, Dr. Chiuchetta vem, como combinado, avalia os exames e dá alta à Alice. Graças a Deus, estamos indo pra casa.

Dr. Cínico não identificou o quadro viral e nunca teria, pois mal tocou em Alice. No final das contas, acabou por não fazer diferença prática alguma, devido à natureza dos problemas. Porém, poderiam ser outros e muito mais graves, coisas que exames clínicos podem diagnosticar. Todos teríamos ficados mais tranquilos e seguros quanto ao que estava sendo feito.

Odeio pediatra que chama a gente de “mãe” e “pai”, “mãezinha” e “paizinho”. Onde, que porra, aprendem isso? Pra mim, é o primeiro sinal de incompetência. Dr. Chiuchetta, meu herói (mais do que o Homem-Aranha ou o Superman), não nos chama assim. Na verdade, ele não chama. Se muito necessário, talvez um “psiu”. As crianças adoram-no. Os pais também.

Se você está pensando em ficar doente no Carnaval, esqueça. Mesmo sem ser feriado oficial em nenhuma esfera, nem mesmo na terça-feira, é o “feriadão” mais importante e institucionalizado do Brasil. Atitude bem adequada ao país. Muito mais importante que véspera e Natal somada a um fim de semana. Nas comemorações de fim de ano, muitas pessoas ficam na cidade, pois passam com as famílias. No pseudoferiadão da “festa da carne”, todos viajam. Inclusive os médicos. Principalmente os bons. Justo. Os não tão bons ficam de plantão fazendo jornadas subumanas e sendo displicentes com os clientes, cada vez mais pacientes. Incompetência e prepotência é uma combinação bombástica na área da saúde.

Eu não diria que ser plantonista da PlanoB é uma forma fácil de se fazer dinheiro (para uns mais fácil que para outros), mas, com certeza, é rápida e indolor. Pelo menos para quem não tem sentimentos.

Alice

É uma graça quando abre a boca e jorra todos os fonemas da forma mais rápida e aleatória possível.
É uma inspiração quando acorda sempre de bom-humor, rindo e querendo conversar.
É curiosa e folgada quando mexe nas coisas do pai, pega o controle remoto (seu preferido) e aponta para a TV fazendo força mental.
É amiga quando brinca com a irmã maior, imitando e inspirando-se em sua heroína.
É um anjo quando sai correndo desequilibrada levantando os braços como se fosse voar.
É madura quando mantém a paz parecendo entender o que faz em uma cama de hospital, com soro na veia e a mãozinha imobilizada.
É uma dádiva quando vemos nela nossa personalidade, nossos traços e trejeitos aumentados e aprimorados.
É a evolução da espécie. E mesmo que as coisas boas em mim e na Stela somem só 50, resultarão 100 em Alice.

Teresa e Daurinha

Teresa é empregada doméstica. Trabalha na casa da Daurinha há cinco anos. Daurinha é uma jovem senhora, professora aposentada. Ambas mantêm excelente relação profissional calcada na cordialidade e no respeito.

A legislação trabalhista para as domésticas não é lá muito generosa com a categoria em termos de carga horária diária, fins de semana e feriados. Mas Daurinha é moderna. Antes da lei vem o bom-senso.

Teresa é ótima empregada; Daurinha é ótima patroa. Uma assina carteira; outra cumpre os horários. Paga sempre em dia; cozinha sublime. Não exije trabalho aos sábados; nunca faltou. Ou seja, não têm o que reclamar uma da outra; e vice-versa. Mesmo em suas pequenas diferenças, se entendem.

Quando a questão é sobre esses feriados não-feriados, como vésperas de Natal e Ano-novo, Daurinha sempre fica chateada em pedir para funcionária vir e Teresa constrangida em perguntar. Na eminência da segunda-feira de Carnaval é a mesma coisa, apesar de saber que nem terça é feriado oficial. Daurinha fica treinando como falar:

— Teresa, segunda podes vir trabalhar? — Não, muito pidão. Parecerá que não se trabalha segunda.

— Teresa, tuas amigas vão trabalhar segunda? — Também não. Onde se viu basear as decisões no comportamento das outras patroas? Depois abrirei precedentes e já viu…

— Teresa, não esquece que segunda se trabalha. — Muito autoritário. Não é do meu feitio. Parecerá que acho que ela não sabe. Que tal algo que misture ordem e pergunta para quebrar o rigor?

— Teresa, trabalha segunda, né? — Mas só confabula.

Teresa fica na passiva. Se Daurinha não falar nada, decidirá se vai ou não. Mas se a patroa disser algo, não terá opção.

Sexta, na hora de ir embora, já com a bolsa em punho, vibrando que nada foi dito ainda, Teresa despede-se mas mete os pés pelas mãos.

— Tchau, Dona Daurinha. Até segunda. — Putz, falei errado. “Segunda”, não!

— Até segunda, Teresa! — Ufa!

Richard Cheese e a Prova-dos-nove

Baixei a discografia completa de Richard Cheese. O cara é fantástico. Pra quem não conhece, um legítimo crooner, acompanhado de sua banda jazz em versões “cool” de grandes sucessos pop. Por exemplo, em “The Girl Is My” (de Michael Jackson e Paul McCartney), Cheese faz um dueto improvável com Stephen Hawking (um imitador, é claro). É de se mijar de rir.

Ouvir verdadeiros hinos da música contemporânea em versões surreais me fez lembrar. Sempre acreditei que uma canção boa de verdade, indiferente do estilo em que foi arranjada originalmente, se prova como tal quando interpretada com acompanhamento mais despretensioso, como com um piano despretensioso ou um humilde violão. A questão é que uma boa melodia sobrevive mesmo em um simples assobio (“um bom assobio”), sem necessidade nem de harmonia que a dê base.

Na voz e arranjos de Richard Cheese também conseguimos tirar a prova. As versões do Metallica, por exemplo, não passam no teste – além de serem engraçadas apenas nos 5 segundos iniciais da primeira audição. É nesse teste de essência que a música-arte distingue-se da música-entretenimento. Algum mérito ou demérito nisso? Não sei. Depende do momento. Apenas uma constatação.

Por que Avatar Merece Ser Visto

A vida é feita de opções. James Cameron soube escolher todas elas com maestria.

1) Por levar 12 anos para ser feito, Avatar não foi originalmente produzido para ser projetado com recurso 3D. Mas confrontado com a tecnologia presente na maioria dos blockbusters atuais, Cameron soube usar o recurso como ninguém, mesmo aos 45 do segundo tempo. Os efeitos não tiram o filme da tela como é comum se esperar. Ao contrário, jogam o espectador para dentro dele. Há, principalmente, profundidade de cena ao invés de elementos que pulam na sua cara e passeiam pela sala de projeção.

2) Usar traços dos rostos dos atores nos avatares que eles controlam e nos na’vies em geral, os tornam mais carismáticos e humanos, gerando identificação imediata com o público.

3) Escolher uma história medíocre e recorrente (apesar de muito bem contada) foi decisão acertada também. O foco do filme é a experiência; é a inclusão do espectador em um mundo de fantasia no qual ele nunca tinha estado com tamanha adesão sensorial. A história não poderia atrapalhar. Enquanto estamos apasbacados com o visual, abrimos a guarda e nos deixamos levar pela lenga-lenga lugar-comum do argumento. Avatar não é um filme que se vê; é um filme que se sente. Você está lá. É a “mentirinha” mais real a qual fui exposto. Cameron precisava levar isso para as massas. E conseguiu.

4) Claro que eu torci o nariz para o blá-blá-blá ambiental explorado pelo roteiro, mas foi outro acerto. Não posso subestimar o poder de influência global de um filme como este. Se é para ser veículo mundial de algum tipo de mensagem, que seja por uma boa causa, além de bastante pertinente.

Avatar é revolução, é uma nova escola. O cinema acaba de mudar, bruscamente. Avatar é um temporal repentino. Se ainda estiver passando em 3D, corra pra ver. Provavelmente, não haverá outra oportunidade.

Sobre Fresno e Outras Coisas

Sim. Odeio emo. Música emo. Contra os emos (pessoas) não nutro sentimentos. Não gosto da música da Fresno, pois são baseadas em fórmulas. Se eu gostasse de fórmulas, tinha feito química. Também não gosto das letras da Fresno, pois são bobocas, recorrentes. Quando ouço, fico pensando “por que ele escreveu isso assim? por que usou esta palavra e não esta outra?”. Estou falando da Fresno porque, ao meu ver, está no topo da cadeia alimentar, apesar das calças de mulher que o vocalista usa. O resto é muito pior. Porém, Fresno é uma das bandas que eu respeito, pois souberam se posicionar no seu segmento, tocam muito bem, cantam muito bem, têm bons arranjos. O show deles deve ser muito bom.

A última coisa que eu quero no mundo é agir como os mais velhos,  quando eu ouvia as minhas músicas: “Isso é música de maluco! Não faz o menor sentido! As músicas da minha época é que eram boas! Pelo volume do instrumento, o baterista deve ser o dono da banda!”. Por isso, eu sempre me dedico um pouco a tentar assimilar o que as novidades têm de bom. Tá tocando no rádio? Deixo rolar. Tão ao vivo na TV, mais ainda. Claro que, nesse processo de assimilação, tenho medo de aceitar demais e acabar vendo qualidade onde não existe, mas esse forma de pensar me é útil, principalmente, como publicitário.

Outra que eu respeito muito é a Pitty. Eu nunca compraria um disco dela. Não é meu estilo. Mas ela é muito competente. Além do mais, gosto do aspecto autoral do trabalho. É muito sincero e visceral. Gosto de trabalho atual, meio jovem-guarda. Vejo Roberto Carlos cantando junto a ela em seu especial de fim de ano. Ele só trocaria a parte que diz “… que me acha foda” por “…que me acha joia”. Mas acho que ela não se importaria.