Em 1978…

Caro Picadura,

Confesso que a primeira coisa que estranhei foi seu nome. Sei que a sua mãe não tem culpa disso. Deve ser, provavelmente, um pseudônimo artístico. Por isso, aconselho-o a repensá-lo. “Picadura” não é muito pop. Definitivamente. Quanto à fita-demo de sua banda, preciso ser franco: ela é muito inconstante. Algumas músicas são muito ingênuas e o fato de vocês serem só três, deixa o som um pouco vazio na maioria do tempo. O mercado não quer isso. Olhe as bandas de sucesso. Essa história de punk (estilo no qual vocês embasam sua “pegada”) não vai durar muito tempo. O lance agora vai ser muito teclado, backing vocals. A música vai crescer. Pode acreditar.

Mas entre todas as faixas de sua fita, percebi que algumas até têm potencial, mas precisam ser melhor trabalhadas. Entre elas, a faixa 2. Em primeiro lugar, vocês deveriam trocar ela de posição. Ela tem que ser a primeira, pois é uma canção de impacto e se não mudar, assim como eu, as pessoas podem ter vontade de parar de ouvir o disco antes dela chegar. Aí, dançou. Ê, musiquinha chata aquela 1. Seguindo na 2, ela inicia muito de soco. O vocal não pode começar assim tão direto. Tem que ter introdução para o pessoal ir se preparando. Ir dançando, entende? Tem que ter um riff forte na introdução também. Quem inventou esse padrão na música pop sabia o que estava fazendo. Acredite em mim. Repensem.

E você (você é o vocalista, certo?) canta bem até, mas o tom tá muito alto. Você tá gritando muito, pô. Tá se esgoelando! Baixa uns 2 dois tons que fica bem melhor. E esse guitarrista de vocês? Cá entre nós, ele não toca nada. Fica só enrolando e não sai do lugar. Muito barulho e pouca nota. Pouquíssima nota. Ele por acaso é pago por nota e vocês tão em contensão de despesas? Isso que essa faixa ainda tem solo, porque as outras nem solo têm. Onde se viu música sem solo de guitarra? Isso é rock, meu amigo! Rock! Tem que trocar esse cara. Urgente! Esse pessoal do metal é que entende de guitarra. Quem sabe você não coloca um desses cabeludos? De repente, ao invés de substituir, se não querem perder o amigo, coloca uma segunda guitarra. O metaleiro fica de solo e o outro fica nos chaca-chacas dele. E quanto ao batera? De onde ele saiu? Ele até é criativo, mas é muito exibido — demais — e dá umas baquetadas meio fora do tempo, né? Eheheh. Bem fora. Não percebeu? Não vai me dizer que é música de vanguarda. Música de vanguarda ninguém compra. Tem que ser tudo quadradinho. Pop, meu amigo. Tem que ser pop!

Outra coisa, reavalie a letra dessa 2. O pessoal não vai cantar junto algo tão melancólico “Me sinto tão sozinho, tão sozinho, tão sozinho…”. Aproveita também e revê o nome da banda. “A Polícia”? Os jovens não gostam de polícia. E se fosse “Os Bandidos”? Isso sim tem cara de rock! Rebeldia. Atitude. Te lembra dessa palavra: “atitude”.
Picadura, troque de nome, siga também meus outros conselhos e, depois, me mande uma nova versão de sua demo. Aí, sim, vai vender milhões. Pode acreditar. Pode acreditar.

Marketing Gravadora

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Para ler escutando “So Lonely” do primeiro disco do “The Police”.

4 comentários em “Em 1978…”

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