For “Now and Then”

Não se trata da melhor música dos Beatles. Não é sobre isso. Não se trata de estarem ou não fisicamente todos juntos. Aliás, algo parecido já aconteceu no “White Album”, que foi quase que totalmente composto e gravado individualmente por Paul e John, com eventuais participações de George e Ringo.

O fato é o que se tinha. E com o que se tinha se fez algo exponencialmente representativo para o legado da banda e deleite dos fãs. Pensar que aquilo que estava “morto e enterrado” pôde ser trazido à vida pela tecnologia, é emocionante. Não é a mesma coisa que recriar a imagem de Elis Regina para um comercial. Nem mesmo a surpresa no final do filme “Yesterday”(que também é alucinante). É além. É pegar uma obra real, cantada por John, e fazê-lá ressurgir como mais uma canção dos quatro para a eternidade; tirar do porão empoeirado e jogar pro mundo.

Lançar a última (será mesmo?) música do quarteto em um single juntamente com a primeira (“Love Me Do”), faz parte do marketing. Eu sou defensor do marketing da verdade. Pra mim isso é o marketing da verdade e que também embala um sentimento verdadeiro.

Paul disse que fechou os olhos e perguntou se era isso que John queria. A resposta foi “sim”. Eu acredito. Pra mim, basta. For “now and then”.

A vida dela

Achei este artigo em minhas pastas. O arquivo está datado de 8 de junho de 2007. Ele fala sobre a música “Minha Vida” do primeiro disco da minha banda, Água de Melissa, que você pode ouvir aqui. Resolvi postar já que aqui é meu repositório.

==================

Quando tenho uma harmonia, uma melodia ou um riff martelando na cabeça, mas não tenho uma letra ou uma inspiração para fazê-la, sou capaz, atroz, de musicar uma bula de remédio, um guia telefônico ou o que estiver por perto. Esse foi caso da música “Minha Vida”. Peguei uma Revista da MTV e achei bonitinho um poema de uma leitora — Maria Carolina dos Santos. Apesar de não me identificar com o teor da mensagem (suicídio, em primeira instância), achei simples (não-simplória), inusitada em algumas passagens e bem construída. Tasquei ficha, dando vazão à minha necessidade de compor no momento. Ficou legal o contraste entre o alto-astral da música com o baixo-astral da letra.

Hoje, temos um clipe para ela e a minha filha de 2,5 anos sabe de cor. É estranho, pouco infantil e bastante inadequado para uma criança, mas quando foi composta minha guria não era nem plano. Agora, quando ela canta ou quando mostro o clipe para alguém, me sinto na obrigação de dizer “olha, a letra não fui eu que fiz, só a música.” Não é como tocar um cover intepretando outro artista. Quando a canção é do repertório próprio, mesmo que seja uma coautoria, parece que damos o aval total à obra.

A gente vai ficando velho e se enchendo de preocupações quanto ao que pensam sobre o que deixaremos na vida. Não me envergonho, nem vou deixar de tocar a música, mas a vida é dela, viu? Não a minha. :)

Taylor Swift e o jeito errado de vender ingressos

Já escrevi uma vez sobre o desgosto que megaeventos musicais sempre me trazem sob o aspecto da experiência frustrante em diversos aspectos do evento (leia aqui). Agora, a decepção é com relação à compra de ingressos para minha filha ir na Taylor Swift.

Os sites especializados adotam a mesma estratégia: todo processo é criado para gerar a sensação de urgência e escassez: “compre agora!”, “garanta o seu!”, “vai acabar!”, “vai ficar no segundo lote será mais caro!”. E aí se monta uma corrida de fãs histéricos em busca do tíquete dourado.

Para ter uma ideia, a quantidade de lugares para os primeiros dois shows que Taylor Swift fará em São Paulo, em novembro de 2023, é de, aproximadamente, 80 mil espectadores no total (depois abriu um terceiro), mas a fila virtual ultrapassava um milhão de dispositivos conectados. Isso indica algumas coisas: (1) muita gente quer ver a cantora; (2) muita gente está acessando com mais de um dispositivo, para aumentar suas chances de pegar um lugar melhor na ordem de espera (são distribuídos de forma aleatória pelo sistema na hora em que está marcado o começo das vendas); (3) tem muito curioso que não vai comprar, mas participa do processo, atrapalhando a vida de quem realmente quer (um ingresso colocado no carrinho sem finalizar a compra, fica bloqueado para outro pretendente e o sistema alega não haver mais disponibilidade); (4) isso sem falar nos cambistas virtuais, que devem estar bem organizados para comprar em grupo o maior número de ingressos possíveis.

Outras dúvidas surgem do fato que a produção do espetáculo não informa quantos ingressos há para cada setor, criando algumas hipóteses conspiratórias. Por exemplo, será que a grade da pista premium não vai se afastando à medida em que há mais interesse em ingressos desse tipo? Quantos ingressos há para meia-entrada? Será que essa quantidade não é “flexibilizada” de acordo com a venda de inteiras? O certo é que todo processo é muito misterioso e não transparente, levando o fã, em quase todos os casos, a embarcar em uma jornada aflitiva que o faz pagar mais do que pretendia no início do processo.

IDEIA MAIS EFICIENTE PARA O PRODUTOR, ARTISTA E FÃ

Inspirado em algumas técnicas de venda utilizadas pelo mercado imobiliário, pensei em um formato melhor.

  1. LISTA DE INTERESSE. Antes da venda, o site abre inscrição para os interessados. Com um limite de quatro ingressos por CPF, o interessado deve arcar com R$ 100 por lugar. A adesão não tem limite total. Pode-se ter 1 milhão de cadastros para um show para 40 mil pessoas. Só quem realmente deseja ir ao evento participa do processo, afugentando curiosos e dificultando a vida dos cambistas. Esse processo também sinaliza para a produção do show e para o artista se é preciso abrir mais datas, qual o patamar de valor do ingresso pode ser praticado, e qual é a taxa de conversão que geralmente acontece. Claro que o valor ser devolvido ao cliente, sob a forma de desconto na etapa posterior de efetivação de compra ou em caso de desistência.
  2. VENDA. Haveria um sorteio entre todas as pessoas que entraram na lista para definir quando ela poderá comprar seu ingresso. Cada conjunto de 5, 10 mil pessoas teria um dia para converter seu interesse ou teria o investimento devolvido.
  3. TRANSPARÊNCIA NO PROCESSO. O sistema iria divulgar claramente quantos ingressos de cada tipo existe para cada setor e tipo. Ao final de cada etapa de venda, os dados seriam atualizados.

Me parece que a ideia acima não diminuiria a sensação de urgência e escassez, que faz vender mais ingressos, e ainda traria outras vantagens aos organizadores, como previsão de interessados, melhor definição de quantidade de datas, melhor definição de preço de ingresso, menor custo de servidores, maior tranquilidade de organização e credibilidade no processo.

Brothers in Arms

Eu sempre fico imaginando tocar essa música com uma banda. Mas assistindo agora e pensando: só é empolgante tocar guitarra nessa música. É sublime, cheio de nuances, dinâmicas, emoções. O resto dos instrumentos é frustrante, chato, repetitivo. Neste momento, lembro que para uma música ficar perfeita cada um tem que fazer o seu papel, por mais chato que possa ser. São todos trabalhando por um resultado perfeito e comum. Abrindo mão de seus egos e dando palco ao conjunto.

Um dia vou ter paciência pra tirar essa música na guitarra solo, ensaiar até à exaustão para ficar bom de verdade — talvez não consiga, vai demorar. E aí, vou tocar com uma banda que tenha saco pra construir e me propiciar esse momento.

Então, poderei morrer feliz.

Beatles Get Back — Voltando de onde veio

Se eu tivesse um podcast, gravaria um episódio sobre o documentário Get Back dos Beatles. Se fosse um youtuber, subiria um vídeo. Se estivesse em um jornal, redigiria uma matéria, faria uma entrevista… Como não tenho nada disso, e os momentos sociais estão raros para filosofar em botecos com os amigos, escrevo este post. Tenho necessidade de colocar para fora tudo que senti assistindo, à espera de comentários complementares ou discordantes. 

Em primeiro lugar, é preciso contextualizar por que o lançamento de Get Back foi algo tão aguardado e está sendo tão comentado.

Os Beatles existiram por apenas 10 anos, em uma ascendência artística meteórica, que os conduziu de boy band a um grupo dos mais talentosos e inovadores que já houve. Foram 13 álbuns lançados, o primeiro em 1963, três anos após o nascimento da banda — da água para o vinho em sete anos! The Who, Pink Floyd, Led Zeppelin e Jimi Hendrix eram contemporâneos. Então, não é que os Beatles revolucionaram sozinhos o rock e que ninguém era inventivo naquela década, como há a tendência de se imaginar. A questão principal é o impacto que uma banda extremamente popular teve. Eles conduziram o gosto de uma geração de adolescentes de uma canção bobinha como “She Loves You” a patamares mais complexos e inventivos como “Eleanor Rigby”. A música pop experimentou algo que pouco se repetiu nas décadas subsequentes. Isso é marcante e incomum.

A contribuição artística foi tanta que, quando comecei a perceber a magnitude da banda — talvez pelos meus 15, em 1989 — já fazia quase duas décadas que ela não mais existia. Uma carreira de 10 anos, que completava 30 aos olhos de alguém de 15. Sua eternidade, ou perenidade, se apresentava. Não existia mundo sem Beatles mesmo depois de seu fim. E interpreto essa percepção só agora, quando vejo minha filha de 12, 50 anos depois que o “sonho não acabou”, impactada pela permanência estética, assistindo comigo ao documentário que acaba de sair no Disney Plus. Tenho a felicidade de ser contemporâneo dos integrantes do quarteto e, minhas filhas, dos dois que ainda restam. Isso é um privilégio que só meus descendentes terão a verdadeira dimensão, quando pensarem em mim, seu antepassado, e a reverenciada obra deixada.

O filme

Claro que um material audiovisual é fruto de decisões de roteiro e de edição. Supressões, emendas, cortes, deslocamentos, tudo isso tem o potencial de contar muitas histórias diferentes sobre o mesmo material bruto que, nesse caso, era vasto. Porém, como não tenho acesso ao restante das 60 horas de filme, só resta discorrer sobre o que vi e sobre a história que Peter Jackson quis contar. E aqui, vale uma filosofada: o que é a verdade senão a interpretação de cada um sobre o que ouve, escuta, vê, sente? E se ela depende disso, quantas verdades existem sobre cada microfato? A própria definição de “fato” passa a ser questionável. Então, vamos nos basear no que o mundo está nos entregando e, nesse caso, sob o meu ponto de vista baseado no do diretor.

O áudio e o vídeo

O filme já começa com Peter Jackson deixando claro que não houve vídeo para todo áudio disponível e, por isso, precisou cobrir alguns momentos com imagens não relacionadas. Imagino o trabalho que deu, pois, mesmo eu ficando nervoso com a falta de sincronia e tentativa de grudar um final de frase com uma boca se mexendo, sei que se esforçaram para fazer o melhor possível. Já editei materiais densos e conheço a dificuldade. Para os menos introduzidos ao processo, explico o que pode ter acontecido: rolo de filme não grava áudio. E, mesmo que gravasse como as câmeras de vídeo atuais, profissionalmente, sempre se tem uma equipe para o vídeo e outra para o áudio. Então, não sei se material foi roubado, estragou, se perdeu ou, simplesmente não foi registrado em conjunto. O fato é que áudios importantíssimos (e muito bem captados por sinal) precisavam ser usados. Eles já haviam, inclusive, sido lançados em bootlegs durante os anos. Os mais malucos já os conheciam.

O maestro

Paul McCartney se mostra realmente a mola propulsora dos Beatles, o cara que leva a banda nas costas. Claro que é um retrato do final da existência da banda; talvez John fosse mais propositivo nos trabalhos anteriores. Mas ali poderia estar em um momento novo de vida, com a Yoko; mais leve, tranquilo e deixando seu amigo conduzir as coisas. Os fãs mais ardorosos de John podem não ter curtido muito essa coadjuvância de seu ídolo, mas para mim, que sempre fui muito mais Paul, está tudo certo.

No primeiro episódio, enquanto conversavam sobre onde seria o show, e algumas ideias foram lançadas, Macca deu o tom. Disse mais ou menos assim “tem que ser em um lugar meio proibido, em que a gente comece a tocar escondido e a polícia venha nos tirar, como no Senado”. Acabou sendo no rooftop, exatamente dentro desse espírito.

Harrison

A discussão com Paul (muito polida, inclusive, a meu ver), que fez com que George quase deixasse a banda, não passou de um fato corriqueiro em uma sessão de ensaio de qualquer artista. Demonstrou mais a insegurança do guitarrista, que era mais novo que os companheiros e que queria se afirmar como compositor, do que uma animosidade real. A versão do filme “Let It Be” da época tentou mostrar o contrário. Só quem já esteve em uma banda sabe que é normal. Que grupo nunca passou pelo problema da música não estar evoluindo em arranjo quando está sendo executada repetidas vezes sempre da mesma forma por todos integrantes? Paul estava apenas pedindo que fosse decidido o que fazer ou a coisa não sairia do lugar. Com o calendário apertado, novamente o baixista mostrava protagonismo na condução, querendo ser prático, objetivo e desenvolver um processo eficiente.

A composição de “Get Back” e “The Long and Winding Road”

É incrível assistir as  músicas que estão no imaginário coletivo serem compostas na nossa frente. Não tem preço, ainda mais para alguém que gosta de tocar e compor como eu. Ficava torcendo para que Paul achasse os acordes e as palavras: “Vai, Paul! Vai, Paul!”. Queria soprar a dica que “Get Back” devia voltar à primeira nota da harmonia antes de acabar a sequência de compassos, como ela é na versão final! Muito legal! Arrepiante!

A ideia do show na Líbia

O diretor da época, Michael Lindsay-Hogg, estava com a ideia fixa de realizar o show em um anfiteatro em ruínas no litoral da Líbia. É muito engraçado vê-lo tentando convencer todo mundo. Quando Paul diz que Ringo não gostaria de sair do país, o diretor logo mais aparece passando a conversa no baterista. Hilário! Ele não quer desistir da sua ideia genial. Sem dúvida, claro, seria antológico. Mas certamente, se os Beatles tivessem seguido a ideia do diretor, Pink Floyd não teria tocado nas ruínas de Pompeia quatro anos depois. Não seria inovador. E isso me fez lembrar do filme “Yesterday”, que mostra como o mundo seria diferente se os Beatles não tivessem existido. Se você não viu, veja “Yesterday”!

Ringo Starr

Ninguém questiona que o baterista era o mais tranquilo de todos. Se restingia a segurar suas baquetas e a seguir sugestões do Paul sobre como compor levadas e climas. Por outro lado, não significa que não era respeitado. Por três vezes, pelo menos, isso fica bastante claro. A primeira, e principal de todas, é que o projeto tinha prazo para ser finalizado justamente porque Ringo participaria de um filme. A segunda, que já citei acima, é quando Paul diz que é o amigo que não quer sair do país, para dissuadir a todos da ideia de gravar na África. E a terceira e mais legal de todas, é quando os quatro estão conversando sobre a sugestão de se apresentarem no telhado. Paul é contra, Lennon fala, fala, mas não deixa clara sua posição. Harrison diz que é “definitivamente” contra. Mas Ringo diz algo como “eu gostaria muito de tocar no telhado”. Pra mim o filme poderia ter acabado ali! Não haveria nada mais significativo para demonstrar a amizade que tinham, e o valor que davam ao companheiro, do que sublinhar que a palavra final sobre um dos feitos mais icônicos da carreira da banda (além da foto deles atravessando a faixa de segurança na Abbey Road) foi de Ringo Starr.

Os demais elementos

Muito legal ver como a equipe era enxuta, como a banda era simples. O engenheiro de som Glyn Johns se mostrou muito mais produtor do que o próprio George Martin, que pouco se manifesta. Inclusive o técnico deu até palpite no arranjo de “Let It Be”. O privilégio daqueles assistentes que ficavam trazendo chás e torradas é sublime. Mas o destaque maior, o mais simpático e carismático, sem dúvida, era Mal Evans, que demonstrava toda sua alegria em participar, inclusive musicalmente de alguns momentos. Mal era assistente desde a época do Cavern Club, o que demonstra a fidelidade e generosidade que o grupo sempre teve. Infelizmente, Mal faleceu precocemente, em 1976.

Yoko

Peter Jackson preferiu mostrar uma Yoko Ono calada. Ou foi a própria que só assim o permitiu. O que muitos diziam sobre ser a causadora da dissolução do grupo (e os mais entendidos beatlemaníacos não corroboram totalmente com essa versão) não se mostra neste filme. O que vemos é um casal apaixonado, parceiro, a ponto de John fazer questão de mantê-la a seu lado, mais até do acho que deveria, quando se trata de uma banda trabalhando. O núcleo de um grupo é sagrado em momentos como esse.

A rivalidade entre Paul e John

Isso é outra lenda que não aparece. Os dois se mostram bastante amigos. E não há relação animosa que consiga ser disfarçada em 22 dias sob gravação constante de câmeras. Vi em uma entrevista Paul falando sobre o filme. Ele diz que o documentário o fez se lembrar de como se davam bem mesmo, coisa que a mídia e o tempo transcorrido pareciam querer provar o contr´ário para ele mesmo. Claro que pode ser apenas conversa para boi dormir, mas não é o que a “verdade” da película demonstra.

Um material sublime

Como é bom poder ter acesso a um produto dessa dimensão. Geralmente (e é compreensível que seja assim), as escolhas de finalização primam por uma entrega enxuta, objetiva, sintética. Aqui, a imersão das quase oito horas de material nos transporta para a época, nos faz entrar em suas cabeças, viver aqueles dias com eles. É um produto para quem é fã. Não serve para quem está descobrindo a banda, claro.

Parece que Peter Jackson tem outra versão, de cerca de 16 horas, que será lançada em bluray. Nem sabia que isso ainda existia, mas é certo que já comprei.

A cultura musical do Tik Tok

Volta e meia minha filhas estão cantando músicas antigas, da década de 60, 70, 80…Semana passada foi ABBA, ontem foi George Michael. Só pra citar as mais recentes.

Mas não se trata de um trabalho de pesquisa antropológica e cultural delas. É que algumas canções de décadas passadas viralizam no Tik Tok, sendo trilha sonora de vídeos replicados, trends e sei lá mais como chamam.

Acaba sendo uma ajuda para manter o repertório e o gosto musical das meninas fora da câmara de resistência cultural que é meu carro, onde quem manda no som que toca sou eu.

Mas quem diria, hein? — “Tik Tok”! Dando um forcinha lá em casa…

Outra constatação sobre esse resgate que a plataforma promove, e que enche meu coração de revanchismo, é que as pessoas vão acabar descobrindo de onde vêm as ideias de Bruno Mars pras suas músicas.

Nomes de bandas que não tive

Para quem sempre gostou de música e teve projetos musicais com os amigos, é impossível não surgirem ideias de nome de bandas, mesmo quando não se está em busca. Passei a anotar. Daí surgiu uma lista de nomes para bandas que talvez um dia fosse ter.

Hoje tenho clara convicção que um nome de banda (ou a marca de qualquer coisa) deve surgir de acordo com a identidade do projeto e não o escolhendo de uma lista. Como tenho muito mais ideias do que reencarnações pela frente para criar projetos musicais, então resolvi compartilhar as mais legais. Se não servirem para o conceito específico que alguém procura, podem ser úteis como brainstorming. Em último caso, apenas para algumas risadas. Pois é, a maioria é pra banda bem-humorada.

Os Implicantes

Todo mundo conhece os Replicantes, né? Mas quando se tem um clima bom dentro da banda, é impossível que a intimidade não crie implicâncias saudáveis entre os membros.

Desmamados no Vizinho

Antigamente, principalmente no meio rural, quando as famílias tinham muitos filhos, era comum, para que o rebento mais novo deixasse logo de ser tão dependente da mãe (afinal ela tinha muitas outras coisas para fazer), que o mandassem passar um mês na casa do vizinho. Sem ver a mãe todos os dias, seria mais fácil abandonar a amamentação materna. Imagina o trauma.

Guri de Merda

Esse é um clássico. Aquela forma “carinhosa” de chamar o piá que só faz besteira. Cabe bem em uma banda rebelde.

Punheta Interrompida

Imagine uma banda punk de adolescentes de apartamento, cuja a maior revolta é quando acontece isso. Só imagine.

Ainda

Esse seria para uma banda dedicada a covers de canções antigas.

Os Cafonas

Na mesma vibe da de cima, ou na de uma autoral, inspirada na Jovem Guarda e com trajes específicos.

E Eu Com Isso

Meu vô sempre dizia.

Como Diz O Outro

Mais uma do Vô Peres.

Os Bocomocos

Expressão para aquele que é meio abobado. Nem existe no VOLP.

Gasguitas

O adjetivo é comum de dois — até existe no VOLP — mas cai muito bem para uma banda só de mulheres, onde as guitarras têm papel preponderante.

Liganete Viscolycra

Na esfera non sense, baseado nesses tecidos modernos com nomes engraçados.

Doble Chapa

Esse é capaz de até ter. Cabe bem para propostas de bandas do sul, que misturam espanhol e português. Além, claro, do duplo sentido viajandão que algumas apreciam.

Burro Freguês

Outra expressão dos tempos de criança. Seria legal para grupo de animação de festa infantil, ou projeto musical para os pequenos.

Três-Contigo

Mais uma do meu avô. Ele usava como vocativo: “ô, três-contigo!”. Ficaria bem para uma dupla, onde o terceiro é o ouvinte.

Mil Invertido

Como se fala em CNPJ, para uma banda de um homem só. Sabe aqueles homens-banda? Ou uma banda de administradores.

9 Entre 10 Dentistas

Pô, esse é massa para bandas formadas na faculdade de odontologia. Ou não.

Aqui Jazz

Para aquela banda de jazz que só toca clássicos de compositores falecidos.

Aqui Abriu Normal

Banda de designers.

Branda

Um sonzinho relaxante.

Quibebes Selvagens

Banda cover do Kid Abelha e os Abóboras Selvagens.

Undercover

Covers só de bandas underground, ou banda de cover que toca em metrô.

Cólica

Formada só por mulheres, fazem só covers da banda Cólera.

Ninguém Nada Menos

Serviria bem para banda cover de um artista muito icônico, como Elvis, Michel Jackson…

Desaforo

Combina bem com músicas de dor de cotovelo.

É Cáqui ou Caqui?

Uma banda que veio pra confundir ou pra explicar?

Los Hermenas

Banda cover do Los Hermanos que reside na Praia do Hermenegildo.

Emicida é alívio no cenário musical

Difícil algo prender minha atenção no cenário musical atual. Até as novidades mais inventivas soam como cópias de outras. Me falta também dedicação para insistir mais vezes e aumentar as chances de assimilação do novo. Nessa situação, é preponderante que a primeira audição seja arrebatadora. E esse foi o caso de “Amarelo”, do Emicida (cuja forma gráfica é “AmarElo”).

Já havia me encantado o anterior “Sobre Crianças, Quadris, Pesadelos e Lições de Casa…”, segundo álbum do artista. Mas este terceiro, com nome de cor, tocou ainda mais forte.

O primeiro ponto é o reforço na coerência da carreira. Quando os valores de uma obra são transmitidos para a seguinte e, de forma ainda mais contundente, consolidam a linguagem e qualidade do artista; se percebe que o talento é consistente e não passageiro. Isso é o ponto um.

Mas o mais importante, óbvio, não é o culto ao artista, mas sua obra.

“Amarelo” arrepia a cada verso, a cada escolha melódica e de arranjo. Sou um entusiasta da mistura de docilidade com vigor. Emicida entrega isso de forma perfeita — é essa uma de suas marcas.

Valorizo a melodia. Por isso, de forma geral, não me encanta estilos ligados ao rap. Uso “rap” aqui, pois é a origem do cantor, mas sinceramente, por isso que falei, vejo uma evolução do estilo com Emicida. São “canções”! Têm melodia sem perder a força da palavra, atributo essencial para o estilo musical do hip hop. Emicida também é literatura. E da mais alta qualidade!

Mas também não é só isso. O valor da obra não está só na forma genial com que está redigido, mas no conjunto: no passo melódico acima do esperado, nos arranjos, nas misturas, nas escolhas bem feitas. Pois se fosse, talvez, para mim, ainda não bastasse.

Emicida não canta a minha realidade, nem minhas questões pessoais gerais. Mas sabe dialogar e transmitir, para pessoas como eu, que também não fazem parte da realidade que ele canta, os temas tratados. Não sei nem se estou autorizado a tratar de um assunto que não domino, mas isso talvez seja o mais importante no trabalho dele: transbordar os temas para outras esferas, não ficarem confinados ao gueto, dar visibilidade. A música e a literatura brasileira estão repletas de exemplos de artistas que souberam trazer à tona realidades do povo brasileiro tão diversas em nosso país.

Por que eu estou escrevendo isso? Porque quando escuto Emicida, eu fico com o peito transbordando. Só isso basta.

Amarelo é a cor preferida de minha filha menor, que tem uma musicalidade aflorada muito grande e escuta as novidades comigo no carro. Aproveito os momentos para nutrir, da forma mais variada que consigo, a curiosidade artística dela. Percebo, por seu silêncio, que os ouvidos estão atentos enquanto o olhar atravessa distante a janela.

Tu sempre tem uma coisa diferente, né, pai?

Emicida é arrebatador!

O cancelamento do show de Shawn Mendes em São Paulo

Dia 30/11, 21:30.

Pegamos um Uber das proximidades do estádio do Palmeiras para o hotel. O motorista estava curioso sobre por que as ruas ao redor não estavam mais fechadas. “O show foi cancelado” — disse a ele. Não acreditou. Horas antes havia deixado mãe e filha, que vinham de outra cidade, para ver o show. Então contei a seguinte história…

Minha filha adora o cantor canadense de 21 anos, filho de português, Shawn Mendes. É um novo Justin Bieber melhorado, pois tem uma pegada mais autoral e aparenta ser bom-moço.

Pois quando, em fevereiro, abriram as vendas para o show do dia 30/11 em São Paulo e decidimos que levaríamos nossas filhas e duas amigas. Conseguimos os ingressos com dificuldade por causa da procura e sistema adotado pelo site. O sucesso das vendas foi tão grande que em seguida também abriram sessão extra para um dia antes, 29. Compramos passagens e reservamos hotel na mesma ocasião. Os pais das amigas precisaram se preocupar também com as burocráticas autorizações de viagem e de acesso a eventos para virem sozinhas conosco.

Como toda adolescente, mil planos e sonhos passavam por suas cabeças. Malu, com sua autoestima e espírito sonhador sempre disse — em um misto de convicção e brincadeira — que iria casar com Shawn Mendes.

Viemos para SP. Ouvimos declaração superentusiasmadas de quem foi ao concerto do dia 29 no Allianz Parque. Como pai, embarquei na felicidade das gurias e estava empolgado também com nossa vez no dia 30.

Os portões abririam às 16:30. Chegamos 17:30 e achamos estranho que ainda estavam fechados e a fila gigantesca, algo pelo qual não esperava, devido à excelente vazão de entrada que o local proporciona. Pelas 18h alguém na nossa frente falou que o show estaria cancelado. Não dei importância, mas logo o assunto voltou à fila e resolvi checar nos sites de notícias. Alguns já noticiavam. Fui nos stories do cantor e ele mesmo confirmara que, por precaução com suas cordas vocais, o médico aconselhou a não se apresentar naquela noite.

Não é preciso dizer que o clima de velório se abateu sobre a massa de fãs adolescentes. Incrédulas, continuavam em seus lugares na fila, se agarrando no último resquício de esperança; como se estivessem vivendo um pesadelo do qual logo acordariam. Mas era verdade. Minha filha e as amigas, que iriam a seu primeiro grande show, desabaram. A gente sempre pensa que qualquer coisa pode dar errado em uma “aventura” interestadual como esta: que o avião vai cair, que não irão aceitar as autorizações de viagem das amigas, que a reserva do hotel vai falhar, que irão nos assaltar em São Paulo… Tudo passa pela nossa cabeça, menos que o artista vai cancelar o show.

Volta e meia a Malu me falava sobre como Shawn Mendes era legal com os fãs e que, quando algo não combinava com essa imagem, era culpa dos seguranças que nem sempre deixam ele se aproximar das pessoas, ou da produção que diz para ir descansar e não tirar mais fotos com ninguém. Subterfúgios desse tipo fazem com que os artistas sejam os bons moços cercados de cuidados profissionais de quem zela por eles. Os maus são os outros.

O motorista só ouvindo e concordando.

Agora, pensa: um show cancelado por uma laringite. Sendo que ele passou o som pouco antes das 16:30. Um médico que, obviamente, não iria atestar que ele pode cantar, colocando em risco os bilhões que giram em torno da carreira do guri. Mas 40 mil pessoas (estimo) ficaram a ver navios por causa de uma dor de garganta. Eu não posso avaliar a gravidade do quadro clínico, claro, mas tenho como dar palite (talvez furado) sobre como sanar o problema e não deixar tanta gente na mão: ele deveria ter ao palco contar do diagnóstico e dizer que havia duas opções: (1) não fazer o show ou (2) fazer com playback. As fãs não iriam se importar. Pelo contrário! Ele sairia por cima! Mostraria que é querido, que se preocupa com as pessoas. Seria mais amado que nunca pelas adolescentes que cantariam de ficar roucas em seu lugar. Mas Shawn Mendes preferiu a opção imatura a estilo Neymar, de quem coloca a culpa nos seguranças por não poder ser mais atencioso e que diz que o médico aconselhou a não cantar. Assim, além não assumir a responsabilidade que deveria como dono de sua própria carreira e reputação, dá provas de que está em apenas em um negócio em que a consideração pelas pessoas não se aplica.

Nisso, o motorista do Uber me fala que no dia seguinte, domingo, Palmeiras e Flamengo jogarão no mesmo estádio. A primeira coisa que pensei foi “Meu Deus! Que logística desmontar um show dessa magnitude em algumas horas para dar espaço a uma partida de futebol de dois grandes times do País”. Mas ele continuou dizendo que nunca houve um jogo ali nessa situação; que sempre que há evento no dia anterior, a disputa é transferida para o Pacaembú.

Eu adoro uma teoria da conspiração. E parece que o uber também. Deixo a imaginação com vocês sobre como a conversa se desenrolou.

Ah! E o aprendizado paras as gurias? Nem todas as coisas se tem controle e que não há pai ou mãe que resolvam de mão beijada para elas. São privilegiadas por terem tido uma oportunidade que quase se concretizou e, duas vezes, por levarem a lição para casa de uma forma, digamos, bem fácil de encarar. A vida vai se encarregar de trazer situações bem mais cruéis.

Dei cinco estrelinhas para o uber.